Eu era gigante. A mata, tão densa, que eu nem conseguia ver o céu. Estava inerte, contemplava não sei o que sob a floresta.
Tinha um tacape na mão direita e o ar parecia deixar tudo mais pesado.
Escurecia em silêncio e a umidade acentuava-se desde quando eu, ali, havia permanecido.
As dores de meus joelhos nem importavam. Eu contemplava todos os troncos e suas frondosas copas, as plantas ao redor da magnificência de uma fauna que, subitamente, sumira - e esse era o meu espanto. Os animais que a mim pertenciam sem o que de mim tirassem, porque eu era mais forte e de tamanho descomunal, sequer ouvia-os...
"O leprosário do humanista"
Eu não sentia medo. Sabia que estar lá com os joelhos corroídos naquela cabana do leprosário com minha família, era o que eu podia fazer: cuidar-nos depois de atravessar selvas e chegar até o deserto onde elas me esperavam sedentas, chorando a saudade que a doença tem o poder de, mastigando-nos, laboriar na memória o que a paz acalenta o coração...
Eu dava-lhes água e pão e cuidava para que os açoites pegassem apenas em mim. Claro que não conseguia livrar-lhes de todos, mas eu era obviamente o mais forte, suportava mais. Depois, exatamente por esse comportamento, os tiranos agarraram-me pelo pescoço com um cabo no qual havia uma espécie de forca feita de corda na ponta, e mesmo que eu falasse da Palavra, como um irmão a outro, o sangue corria, e eles arrastavam-me para o brilho de um sol inclemente. Apenas quando desmaiado, devolviam-me ao casebre imundo onde água eu implorava depois de acordar com a boca e todo o resto ainda tomado de areia, embora elas tentassem tirar a imundície do sangue, do suor e da terra de mim cuidadosamente e derramando suas lágrimas.
Essa havia sido a terceira surra. Por algum motivo indecifrável, depois, jogavam pão e punham água à porta.
Escureceu e as dores eram terríveis. Pão já não havia e nossos lábios, após aquele sol terrível do deserto, eram mais áridos do que o céu azul e assassino que, por sua vez, era mais cruel do que os próprios guardas. Mas a noite vinha também das alturas e, a tempestade, do chão que nos sustentava, logo nos engoliria...
"Até essa morte..."
Eu quase expulso daquela hermética bomba d'água. Tudo úmido e de repente eu tinha o nariz sentindo o ar, mas o resto de meu corpo não conseguia sair. Um cordão que antes servia para me alimentar, sufocava-me, e eu não entendia isso.
Então, o ar que me gelava faltou quando o cordão, hirto, do qual tentava livrar meu pescoço, foi pego por minha mão num instinto já falho...
Desmaiei quando voava num corredor branco. Uma gritaria e a secura do ar de dezembro me afligindo como se um ser tomasse meu corpo para qualquer coisa que não fosse eu.
A inconsciência era o meu estado. Aparelhos acudiam minha vida. Meu peito era dor. Qualquer coisa que houvesse ao redor de mim causava-me um tremor súbito em meus pequenos olhos para esse mundo me recebendo roxo - tal a quantidade de fezes inspiradas até meus pulmões - mas a cegueira pesava fundo até o meio de meu imaturo crânio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário