sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Lancinante Espelho

O espelho retalha-me o rosto
E faz sangrar minhas ideias.

Dividir é igual a multiplicar
Se pensarmos metafisicamente,
Se dialogarmos
Com nossa luz e nossa sombra.

Saboreio o que de mim escorre:
Sangue, suor, pus, saliva, câncer.

Tão longo cotidiano:
Passivo o suficiente
Para nada enxergar
No outro
Lá dentro do espelho.

Réplica.

Condução de movimentos
E
Atropelo de vontades.
Sonhos necrosados em meu esôfago.
O sangue que já sinto falta do gosto...

Seringas de algodão
Em meus pesadelos recorrentes
Espetam-me
Não a Vida,
Mas a dúvida de viver.

Restauração ao acordar
Para encantar-me
Com o árduo sonho
De esparramar o sagrado
Profundo
De todas as metáforas que sou,
De toda a certeza
De ser sem nada ser ou querer ser,
Mas sendo
Porque realidade é sonho.

Concreto é o coração:
Como o perfume
E a sede
Que a mulher
Explora a sedução
E conduz meu vício.

Errante é a alma:
Caleidoscópio de memórias
Que o Tempo
Investiga e enforca,
Ou deixa, nelas, goteiras torturantes.

Alguém aí se lembra
De uma tarde longínqua
Tendo parafusos no crânio
Como visita na sala de estar?

Olhe para a pessoa ao seu lado.
Experimente a cadência da mão mais próxima,
Sua textura, seus desejos, seus medos, suas sensações.
Talvez esteja calejada
De chaves-de-fenda
Para existências herméticas,
Talvez, enferrujadas...
Abrigue o seu ser num abraço,
Sem medo.
Olhe nos seus olhos:
Essa pessoa precisa de você,
Da sua mais triste dor,
Do seu mais profundo silêncio,
Da sua mais lancinante comoção
E do ardor que faz vibrar seu coração,
Dos olhos que não lhe reconhecem mais.

Faça dessa pessoa
O seu espelho
E divida-se para
Multiplicarem-se.

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