sábado, 29 de maio de 2010

A Calma e o Sonho

Por que essa frieza,
essa apatia para situações
que antes eu era um vulcão?
Eu estou aí e aqui.
Logo estarei aí
e em um local que não existe
como aí.
Mas aí existe, assim como aqui.
E ambos são nossos!
Eu dormi o dia inteiro.
Meus olhos estão inchados de tanto nada.
Os peixes - em ambas as casas - existem,
mas aqui é de papel
e aí é num aquário
para divertir a criança perto de Deus.
Meus cabelos branqueiam.
Amanhã um ritual de envelhecimento,
amadurecimento e satisfação
no seio familiar e do Amor.
O dia será especial... é o que peço a Deus.
Assim como o fim do suplício
dessas eternas bifurcações
em caos, lavas, furacões e esquisofrenias.
Sem lutas, amada!
Te quero na Paz e no Amor!
O céu me enterra.
O que será ilusão?
E sonho?
Queimei minha pele
e banhei meu corpo querendo dividir,
Amada, contigo
aquelas horas mais felizes.
Havia dragões e mundos submarinos
se confundindo com o éter
da natureza abundante.
Sem alienação.
Ali eu estava e te queria e queria estar ali.
Escalei e desci para a cachoeira.
Abanei para os guardiões lá no topo e eles
jogaram suas almas para mim.
Eu gritei.
Era primal o som gelando meu crânio e meu peito.
E pedi a Deus que me recuperasse.
Saí e fui até o Sol.
Lá onde esquenta o coração
e as cinzas são pedaços
das estrelas que partiram.
À noite
o céu ficou órfão
sem que eu pedisse qualquer força.
Eu apenas admirava as nuances de preto e branco.
Eu não preciso enlouquecer.
Eu não vou enlouquecer.
Eu vou superar quedas
e elucubradas palavras que não agem.
Vejo outra sombra.
Não havia ninguém - de novo -
quando olhei pro lado.
Normal.
Procuro o silêncio dos que trabalham:
motoqueiros atrasados,
pedreiros martelando o próximo arranha-céu,
loucos sintetizando a vida numa frase que é sempre a mesma
maquinada, maquinada, maquinada,
executivos odiando o calor e pensando no dinheiro,
poetas exagerando tudo,
crianças produzindo seus corpos para adultos sacanas,
a rua inteira morta de lixo,
invadida
pelo sopro quente do vento entoando o Hino Nacional,
um bêbado gritando que é campeão esquecendo de amanhã,
e eu acreditando nisso tudo,
pois para tudo isso há uma ciência
e um jogo de cintura,
para levar adiante.
Cá estou:
esfolado,
incontido na arte solitária dos meus grãos.
E a estupidez
força forca
na praça da razão.
Um cão estúpido preenche com sua sarna
uma canção erótica
assobiada pela prostituta
banguela
cheirando a foda.
É dia outra vez
e o sol
mói suas tetas caídas e lindas.
Sabe que será só mais uma repetição.
Eu não sinto saudades de nada.
Eu sinto o Amor por ela.
Eu acho que desejo ficar só
para,
amanhã,
querê-la.
Há boatos em minha cabeça.
Falácias que essa mesma peça engenhosa
que vê beleza nas pernas dela,
ou num pô-de-sol,
contam para o resto do ser
e o corpo desaba.
Então, meu coração é o grande mestre
na tempestade seca das ações e tolices:
reencontra meu ser
e eu sou surpreendido pelas palavras dela
e, então,
quando perdido,
nela me
encontrei
outra vez.
E, mesmo assim,
piro,
mesmo sabendo
da calma e do sonho.

Dor

Cheiro de álcool.
Tenho meu sangue limpo.
Desligo-me um pouco mais do mundo.
Ela não estava pra mim.
Sinto-me só e não sei mais sobre amá-la.
Ela não me deixa tocá-la,
mesmo...
tão...
perto...
Hoje eu teria chegado apenas perto de novo,
não adiantaria minha ilusão.
Creio em mim e acho que o Amor se foi.
Das últimas duas noites
com ela
o que senti foi angústia e decepção.
Uma criança doente chorava no sofá pedindo ternura.
Enquanto ela reclamava do carequinha,
eu o pus no colo
e ele só choramingou
e, então, aquietou-se
no colo de sua mãe.
A discussão, ela - a tia - perdeu.
Havia um gosto nisso.
Eu senti vontade de partir.
Ela até sorriu, mas
chegar perto era uma chatice.
Sua frieza era uma chatice,
me tornava amargo...
Eu encontrava-me e perdia-me ao seu redor.
E longe também.
A criança me olhava
e chamava meu nome
Pedro
era meu nome de novo.
Então dava vontade de ser pai.
Olhava pra minha namorada
e tinha dúvida
- agora-
porque com ela...
Eu não era fraco, longe disso!
Apenas sabia amar com ternura
e com meu corpo,
com poemas e momentos
que eram para ser só nossos.
Há mais de uma semana
que não sentia
o perfume
de suas coxas, buceta, seios.
Os lábios viravam bochecha.
Língua?
Esquece...
Ir no seu trabalho hoje seria tortura.
Fico aqui esperando o tempo.
A tarde é silenciosa e sem falsas promessas.
Sem promessa de que a verei na praça,
na rua
ou na morada, como desejo.
Estou ansioso.
Os pormenores das oscilações são:
paralisia tratada com poesia,
uma pitada de silêncios ao telefone
e a quase certeza
da falta de amor.
Eu quero vê-la se dirigindo a mim?
Quando oscilei e dei-lhe adeus, sofri só.
Não quero sofrer, mas sofro.
Quase aquela transa...
O som está acontecendo por lá.
Eu sou paranóico, mas estou bem.
Ouço a serra dos vizinhos.
Eu a amo e não a amo
porque ela me põe
para
longe
quando estou tão perto,
me chama
de longe,
mas não agora,

quando
ela puder...

Criança de Amor

A geladeira estava repleta de novidades infantis:
doces coloridos,
chocolates em potes
organizados estrategicamente ao alcance das mãos do guri.
Só no fato de tê-lo na memória,
lhe fazia chorar
e lutar pela saúde,
para seus dias não abalarem-se na comoção que poderia
ser a percepção do câncer em seu organismo pequenino e forte.
Ela sorria também, com fé.
Todos os tubos
e a quietude eram pura bravura,
uma extraordinária forma de suportar a doença
e desdenhá-la de coração para a Vida.
Deus estava com ela no olhar,
dizendo o Amor,
encarando dores e tolices.
O que poderia abalar-lhe?
Eu era seu admirador, poeta e amante
e sabia que não seria fácil
ficar perto quando o silêncio
imperasse,
e eu teria de silenciar
para não pedir demais.
Perdê-la seria uma cruz sobre os ombros
já arqueados pelos dias
me perguntando
"o que diabos eu fui fazer, meu Deus?
Como pude ser tão egoísta outra vez?"
Ela contava as horas
enquanto eu observava o espelho.
Ela arrumava a casa
e a ternura era
o próprio silêncio,
os movimentos necessários.
Eu não conseguia
chegar perto
de
seu
conforto,
mas ali estava
procurando-a,
procurando-me,
encontrando-nos
e sonhando.
Eu queria atenção,
cuidados pela noite em sua casa.
Era dia quando eu a vi pronta.
A criança chegaria para um repouso
e logo teria a quimioterapia.
Eu cuidei do meu corpo dolorido
enquanto lhe enviei coração pensando no pequeno.
Eu sentia saudades
e sabia que elas aumentariam.
Eu tremia de café
e exaustão
em minha cabeça!
Procurava administrar a razão
para que as emoções,
por ela propostas,
não desviassem todas as certezas.
Eu queria a sua ternura,
mas não consegui me despedir
como imaginava a bondade.
O Amor ainda
e todos os caminhos pela sua estrada
levaram-me
aos
nossos
passos,
a uma calma que sabia
que atingiria,
como a cura
daquela
criança de Amor...

O Abraço

Dias longos.
Solidões matemáticas.
Um beijo a cada manhã amenizando.
O silêncio da exaustão a noite.
Um choro teu que não pude controlar.
Um espaço apenas teu.
Então, amizades numa janta
em que me davas outra vez tua mão.
Minha disformidade tentava não pensar.
As piadas ajudaram-me,
suavizaram o momento.
Tu não me tocavas de novo.
Eu não te tocava.
Fomos embora de mãos dadas, porém.
Perguntei e falei que via coisas demais
onde nada existia.
Concordaste calmamente.
Eu até sorri, mas não tem graça...
A manhã veio
e o tempo
era para cada um de nós:
tu pra lá, eu pra cá
e isso é Amor também
porque há respeito.
Engoli o mar e enrouqueci.
O sol não ardia, mas sustentava-me por ali.
As pessoas tinham pouca graça.
Te aguardava procurando não pirar.
Paranóia emblemática:
saudade que se deseja por fim.
Tu sob o efeito das flores que só vi uma.
Espera doentia sem saber de flor.
Tu chegando com o sol no rosto.
Eu ainda inseguro e paranóico.
Diálogo impossível.
O tempo ardendo.
A Arte me recuperando na viagem de volta.
Eu te admirando,
vendo o quão responsável és...
com teu trabalho...
Na noite anterior
tu tinhas chorado
e eu queria entender,
queria saber se eu havia feito
algo sem perceber.
Diabos!
Finalmente tu disseste que não.
Eu fiquei tranquilo - um pouco,
pelo menos -
e te deixei chorar poesia.
Pensava demais,
um tambor girando na minha têmpora.
Te imaginava dançando
e me olhando
com Amor e tesão.
Chegamos e deixamos a todos com afinco,
pudemos acolhermo-nos:
O Abraço
que não me sai,
que me responde a todas as dúvidas e dores,
representando fielmente
todos gestos de Amor,
toda nuance corporal indicando
trabalho cumprido e um conforto
que lembrava o abraço da praça:
era noite,
mas amanhecíamos...

Objetivo Acefálico

Essa fome terrível,
essa fome angustiante
roendo minhas artérias
pela necessidade por ti!
Esse tempo acefálico
engolindo minha cabeça
como um ciclope insano
que tenho de superar e,
então,
a sanidade e o sonho do coração!
Esse espaço te procurando,
inteiro eu
por todas as vias
que levem-me ao teu encontro!
Esse perfume de memória
rasgando incertezas,
pondo-me,
pela poesia
e pelo objetivo,
em ti!

Princesa de Ébano

Mais uma vez o perfume de tua cor.
A pele que quis e não quis me amando,
empossando com o suor da voz
uma rouquidão apaixonada.
Eu na surpresa de um amor.
Eu com medo ou sem vontade de amar
pensando sobre o amar e o ser amado.
Princesa de ébano.
Uma flor roxa e deliciosa de lábios.
A tua humanidade esperando minha selvageria,
querendo minha fala.
Escravo da insônia,
fui sorrir no escuro
o que iluminaste
por alguns
minutos em meu peito.
O sonho de uma longa viagem até o teu prazer.
A praia do teu sangue
inundando meus olhos: as vias
do meu corpo
irrigadas pelas ondas de teus movimentos.
O meu corpo com
ânsia
esperando por uma noite que nos una
no prazer que o prazer, me trazendo prazer
será paz.
Meus olhos vidrados te elogiando:
linda!
Meu corpo te esperando.
Meu coração à deriva.
Minha mente tramando.
Meu ser, de ti, não se esquiva.